Nova Phenix Renascida - capa

 

 

É um número único, publicado no verão de 1921, de pouco interesse gráfico e escassa colaboração artística. 

Tem, no entanto, um artigo de Ernesto Gonçalves sobre os Bailados Russos, uma colaboração curiosa tendo em conta que Manuel de Meneses, num editorial severo, faz uma crítica a Manuel de Sousa Pinto, autor de 'Os Russos' (1918), livro fundamental para o estudo da recepção dos Ballets Russes em Portugal. Deste autor diz Meneses que possui um "possidonismo literário", mas ataca igualmente outros intelectuais e escritores portugueses da nova geração, como António Patrício (que se caracteriza, na sua opinião, por demonstrar uma 'prosa metrificada') ou Augusto de Castro.

 Neste texto inicial, Manuel de Meneses começa por entrar desde logo em contradição com o jornalista católico Álvaro Maia - que terá a sua própria polémica com Fernando Pessoa no ano seguinte (com o artigo “Literatura de Sodoma”, publicado na Contemporânea n.º 4, de Outubro de 1922, em resposta ao artigo de Pessoa publicado na mesma revista, “António Botto e o ideal estético em Portugal” (n.º 3, de Julho de 1922) - tendo em conta um suposto inquérito literário sobre literatura contemporânea (de 1918-21), que resultou num 'fiasco' [sic].

De seguida, e pondo de lado Júlio Dantas e Malheiro Dias como verdadeiros talentos, acaba por atacar as mulheres escritoras: "Outro sintoma grave da nossa decadência é a invasão das mulheres no nobre campo das letras, com uma torrente de livrinhos fáceis e banais que, espremidos, são mais do que um documento da nossa mentalidade desvigorada e chocha."

É assim um artigo de ajuste de contas com várias personalidades importantes desse período, uma revanche pelo despeito com que foi tratado o seu opúsculo A Novíssima Geração (1917), daí o seu título de "Portugal Literário". Um texto anti-programático para uma revista que se pretende sem "o pedantismo de um programa", tudo em nome da "liberdade de espírito elegante, ordenada e europeia.", mas que acaba por se apresentar bastante conservadora nos seus referentes. Um mote pouco progressista a uma revista que se quer 'nova phenix renascida'.

Atestando esta ideia, as páginas finais sobre edições recentes, da responsabilidade de Meneses, continua na senda de polémica, salientando como duas únicas edições dignas de destaque, reedições de livros de dois escritores consagrados: Eugénio de Castro (não podemos esquecer que esta é uma revista de Coimbra) e do alentejano Fialho de Almeida.

Nas contribuições literárias, salientam-se os sonetos do madeirense Cabral do Nascimento, um conto do director da revista (Luís Vieira de Castro) bem como alguns "poemas orientais" de Álvaro Manso de Sousa. 

 Nesta revista confirma-se ainda a importância canónica e tutelar da figura de Camilo Castelo Branco neste início de século (de que uma publicação como Camilliana, aqui presente, é sintomática), com um artigo sobre duas cartas inéditas do escritor nortenho, com uma grande chamada de atenção na página de índice. Esta intenção de homenagem é depois confirmada nas páginas de crónica literária, onde se fala da amizade do escritor com Francisco Vieira de Castro, certamente da família do director... 

 

Ricardo Marques