(1865-1939)

W. B. Yeats, como Fernando Pessoa, foi um poeta dramático, cuja obra depende da adopção de diferentes máscaras literárias.  Se Pessoa escreveu poetas em vez de escrever peças de teatro, um poema típico de Yeats, segundo Harold Bloom, é como um trecho de um drama poético.   

Em “The Second Coming” (1920), Yeats exprime o sentido de fragmentação intrínseco à condição moderna: ‘Things fall apart; the centre cannot hold’.  O eu em ruínas encontra a sua expressão mais dramática na explosão heteronímica de Pessoa.

Yeats desenvolve a sua célebre ‘teoria da mascara’ em vários escritos e poemas.  O artifício de máscaras projecta uma imagem idealizada e protege o verdadeiro ‘eu’.  Para Yeats, o fingimento, ou a adopção de máscaras, é a fonte de energia criativa, e tem além disso a vantagem de libertar o poeta da sua história pessoal e do julgamento por parte do público.  Os heterónimos pessoanos podem ser encarados como uma evolução radical da teoria de Yeats.  Ou, abordando o mesmo problema em sentido inverso, algumas máscaras yeatsianas estão muito próximas dos heterónimos de Pessoa.  No poema ‘The Tower’ (1928) Yeats escreve que:

 

And I myself created Hanrahan

And drove him, drunk or sober, through the dawn.

 

Estas palavras podiam ser uma descrição das máscaras heteronímicas de Pessoa.  É interessante notar que Hanrahan é baseado um poeta real, e partilha com Yeats fortes traços psicológicos. 

Em ‘The Player Queen’ (1922), Yeats reconhece que o problema está em separar a máscara poética da cara que ela encobre: ‘Seeming that goes on for a lifetime is no different to reality’. Ou seja, o fingimento ao longo de uma vida inteira é igual à realidade. A afirmação é perfeitamente aplicável ao caso de Pessoa, terminando o poema de Yeats com uma das perguntas centrais para a crítica pessoana: ‘How can we know the dancer from the dance?’

Sabemos que Pessoa conhecia a obra de Yeats: existe na sua biblioteca um volume de poemas do irlandês, publicado em 1913, e foi encontrado no seu espólio o esboço de uma carta dirigida a Yeats.  Há outras referências directas que indiciam um conhecimento íntimo: Álvaro de Campos ataca-o no “Ultimatum” (1917) como “Yeats da céltica, bruma à roda de poste sem indicações, sacco de pôdres que veio à praia do naufragio do symbolismo inglêz!”  Este é o Yeats da primeira fase, altamente romântico, fantasioso e nacionalista; o Yeats de poemas como os reunidos no volume The Celtic Twilight (1893).  É evidente que Pessoa, como muitos leitores, sentiu-se mais atraído pela obra tardia de Yeats, infinitamente mais modernista e esotérica.

Além da influência das estratégias poéticas de Yeats sobre Pessoa, há também uma forte vertente ocultista que liga os dois poetas, pois ao longo de suas vidas ambos demonstram um forte interesse pelo misticismo e pelo sobrenatural.  Yeats descreve as suas ideias esotéricas em A Vision (1925).  Tinham conhecidos em comum nesta área, como Annie Besant e Aleister Crowley.  Participaram ambos em sessões espíritas, praticaram a escrita automática e receberam comunicações astrais.  As suas tendências ocultistas têm, em termos literários, maior interesse pela forma como encontram expressão artística na sua poesia mais conhecida, como nos poemas tardios de Yeats e nos poemas ortónimos de Pessoa.

 

BIBL.: García, Rubén, ‘The Unexpected Affinities: W. B. Yeats and Fernando Pessoa’, Journal of the American-Portuguese Society, X, 1, New York, 1976; Macedo, Suzette, ‘Mentira, fingimento e máscaras: alguns comentários sobre Oscar Wilde, W. B. Yeats e Fernando Pessoa’, Colóquio de Letras, 107, 1988; O’Donohgue, Bernard,  ‘Fernando Pessoa and W. B. Yeats’, Portal Pessoa (www.portalpessoa.org), 2006

 

 

 

Mariana de Castro