[BNP/E3, 141 – 40]
Toda a poesia - e a canção é uma poesia ajudada - reflecte o que a alma não tem. Por isso a canção dos povos tristes é alegre, e a canção dos povos alegres é triste.
O fado, porém, não é alegre nem triste. É um episódio de intervalo. Formou-o a alma portuguesa quando não existia e desejava tudo sem ter força para o desejar.
As almas fortes atribuem tudo ao Destino; só os fracos confiam na vontade própria, porque ela não existe. O fado é o cansaço da alma forte, o olhar de desprezo de Portugal ao Deus em que creu e que também o abandonou.
No fado os Deuses regressam, legítimos e longínquos. É esse o segundo sentido da figura de El-Rei D. Sebastião.
FERNANDO PESSOA