Arquivo virtual da Geração de Orpheu

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Empresa criada por Fernando Pessoa com o objectivo de promover a cultura e o comércio portugueses no estrangeiro e de divulgar, em Portugal, os clássicos da literatura mundial. Pensa-se que, numa primeira fase, teve o nome de Cosmopolis. Funcionou entre 1921 e 1923 e teve o seu escritório na Rua da Assunção, nº58, 2º, na Baixa, com o nome completo de «Olisipo, Agentes, Organizadores e Editores». Foram sócios de Pessoa nesta empresa Geraldo Coelho de Jesus, engenheiro de minas e administrador das minas de Porto de Mós, e Augusto Ferreira Gomes, poeta, novelista e jornalista. O logótipo da Olisipo foi desenhado por Almada Negreiros. Todo o projecto era extremamente ambicioso e Fernando Pessoa teria um papel activo nas diferentes áreas do empreendimento. Movia-o o desejo de reorganizar a sua vida, de fazer a personal rectification of life, como consta de um plano. Pessoa esperava conseguir uma tranquilidade económica que lhe permitisse estabilizar e dedicar-se em pleno à sua obra. O projecto da empresa Olisipo dividia-se por três áreas: a editorial, com publicação de importantes obras da literatura portuguesa e mundial, que seriam traduzidas para inglês umas e para português outras; a Companhia de Produtos Portugueses destinada à propaganda de produtos portugueses e à divulgação do país no estrangeiro; a área comercial, onde a empresa serviria de intermediário em negócios de minas, na montagem de novas indústrias e na organização e venda de patentes, para além de fazer traduções. Pessoa estabeleceu uma longa lista de subscritores e de accionistas, com acções a 50$00. Planeou a localização, pelo mundo, das agências da Olisipo. A propósito da Exposição do Rio de Janeiro, delineou um Álbum de Portugal, para a propaganda do país. Outro projecto seria o «Almanach Portuguez para 1921», com informações úteis sobre hotéis, companhias de seguros, consulados e artigos sobre a política portuguesa, sobre salários a exploração mineira. Pessoa criou vários inventos que planeava comercializar, como, por exemplo, um tipo de estenografia adaptada a várias línguas, a Aristography, e vários jogos de tabuleiro, como football, cricket, strategy, e também Aspects, um jogo astrológico. O projecto editorial da Olisipo era especialmente ambicioso. Seriam publicadas as obras de Shakespeare, de Coleridge e de Edgar Poe traduzidas para português por Pessoa ele próprio, que também traduziria para inglês Espronceda, Camões e Antero de Quental. A Ricardo Reis caberia a tradução dos clássicos para português: Ésquilo, Aristóteles, uma Antologia Grega e os Poemas de Safo e de Alceu. Thomas Crosse seria o tradutor para inglês de Alberto Caeiro e Rafael Baldaya das Trovas do Bandarra. O Príncipe de Maquiavel, Laocoonte de Lessing, A Renascença de Walter Pater são outros exemplos de obras estrangeiras a serem traduzidas e editadas. Alguns poemas dramáticos de Pessoa, como Fausto, Prometheus Revinctus, ou a Trilogia dos Gigantes, seriam igualmente publicados, assim como certos ensaios. Deste vasto plano pouco se concretizou. No final de 1921, foi publicado A Invenção do Dia Claro, um poema em prosa de Almada Negreiros. De seu, Pessoa publicou os English Poemas I-II, integrando uma versão revista de Antinous e Inscriptions, e English Poems III, com Epithalamium. No início de 1922, a Olisipo lançou a 2ª edição das Canções de António Botto e, nos primeiros meses de 1923, Sodoma Divinizada de Raul Leal. A violenta polémica que surgiu na sequência destas publicações teria consequências funestas para a Olisipo. O artigo elogioso de Fernando Pessoa, na revista Contemporânea (nº3, Julho de 1923), com o título «António Botto e o Ideal Estético em Portugal», chamou a atenção e, no número seguinte da revista, Álvaro Maia contestou as opiniões de Pessoa. A Liga de Acção dos Estudantes, organização de universitários católicos de extrema-direita, promoveu uma campanha junto do governo civil e dos jornais contra a literatura de Sodoma. O governador civil de Lisboa mandou apreender vários desses livros “imorais”, entre os quais se encontravam os livros de Botto e Leal. A polémica deu origem a dois panfletos de Pessoa: Aviso por Causa da Moral, assinado por Álvaro de Campos, e Sobre um Manifesto de Estudantes, em seu próprio nome. O projecto da empresa Olisipo acaba por se extinguir em 1923.

 

BIBL.: António Mega Ferreira, Fazer pela Vida, Um Retrato de Fernando Pessoa, o Empreendedor, Lisboa, Assírio & Alvim, 2005.

 

Ana Maria Freitas