É preconizado em 1895, por Manuel da Silva Gaio, no artigo “La Jeune Littérature Portugaise”, que inaugura a Revista Arte (1895-1896), dirigida por ele e por Eugénio de Castro.  Nesse texto, o autor arrola Fialho de Almeida, Luís de Magalhães, Moniz Barreto, Eugénio de Castro, Alberto de Oliveira, António Nobre, além dele mesmo, e destaca, na obra desses autores, a linguagem vibrante e carregada de emoção das coisas, o lirismo contemplativo da natureza, a expressão direta das emoções, a melancolia resignada, e, quanto a si, apresenta-se como “corifeu do movimento nacionalista e regionalista em Portugal” com a publicação das Canções do Mondego (1891). Das Palavras Loucas (1894) de Alberto de Oliveira salienta o “retorno à inspiração, aos motivos e aos aspectos simples da vida nacional” e o estar “imbuída de um neogarretismo” que a crítica há de considerar com alguma reserva.

Manuel da Silva Gaio foi reputado, por António Sérgio e António Sardinha, predecessor do Integralismo Lusitano, o que indica que as tendências neo-românticas estiveram ligadas umas às outras e que os autores muitas vezes transitaram de uma para outra. Veiga Simões indica-o não apenas como precursor do Neolusitanismo, mas também como o “ponto central” de geração que perfilou essa tendência. Em sua obra vê-se o nacionalismo sebastianista, a consciência do sentimento de raça buscada em autores como Bernardim Ribeiro, Cristóvão Falcão, Sá de Miranda, Luís de Camões, e a perspectiva universalizante, decorrente de sua formação clássica, que deriva na adesão às formas quinhentistas. Veiga Simões efusivamente aponta-o como o “único da sua camada” que verdadeiramente sentiu e conheceu o “fundo renovador duma literatura”, aspecto que procurou na tradição nacional do lirismo de Quinhentos e adaptou ao seu tempo. Essa consciência é o fundamento do Neolusitanismo. Gaio escreveu poesia, novela e ensaios (p. ex.: Últimos crentes [1904], Torturados [1911], Sulamite [1928], Vencidos da Vida [1931], Bucolismo I. Bernardim Ribeiroe Bucolismo II. Cristóvão Falcão[1932-1933]).

O Neolusitanismo teve precedentes no final do século XIX: aproxima-se do neogarrettismo, teorizado por Alberto de Oliveira, em 1894, e com o qual concorre quanto à primazia na doutrinação do nacionalismo literário que caracteriza a geração de 1890, além de Afonso Lopes Viera de O Náufrago (1898), que viria a ser um dos nomes relevantes dessa tendência. Manuel da Silva Gaio reconhece aqueles ismos, assim como o regionalismo literário de 1890, como derivados da tendência que inaugura com Canções do Mondego e apresenta no artigo “La Jeune Littérature Portugaise”. João de Deus é tido como o mestre desses ismos, sobretudo pela via do romantismo amoroso sentimental, e dele são devedores Teófilo Braga, Manuel da Silva Gaio, Alberto de Oliveira, António Nobre, Eugénio de Castro, entre outros. A essa característica se pode acrescentar o lirismo de guitarra coimbrã, o exotismo parnasiano e o baudelairiano, a transformação da crença religiosa em crença intelectual manifesta em panteísmo (como se vê nas Tentações de São Frei Gil [1907], de António Correia de Oliveira).

O Neolusitanismo está ligado ao drama histórico, ao sentimentalismo, ao visionarismo sebastianista, à reação ruralista e tradicionalista e a sua filiação dogmática deriva tanto do Idealismo nacionalista de Oitocentos, conforme indicado acima, como da certeza de que a Criação do homem, do mundo e das coisas tem finalidade teológica predeterminada, originária, e é compatível com a ordem social em que aparece. O Neolusitanismo desenvolve-se paralelamente à dicotomia crescente entre campo e cidade (daí muitos autores originarem da aristocracia e burguesia rural, provinciana) e ao avanço dos estudos filológicos, etnográficos e históricos. Inclui-se como uma das tendências (de viés etnografista, note-se) do Neo-Romantismo e pode ser considerado como a expressão mais bem acabada da saudade idealizadora do espaço e das tradições rurais. Destacam-se, como seus temas fundamentais, a vivência do tradicional, do castiço, do mistério, da religiosidade, das crenças e práticas do catolicismo e do dolorismo cristão; a denúncia social; a nostalgia da infância; a evasão pela fantasia e pelo maravilhoso; o enaltecimento da virtude da caridade; o fervor nacionalista manifesto na concepção de “Pátria precursora”, segundo a qual há o destino nacional de grandeza, queda e ressurgimento. Por essa via de exaltação histórica da Nação dá-se o engajamento político do Neolusitanismo às manifestações monárquicas, bem como à ideologia sebastianista do Quinto Império (p. ex.: D. Sebastião [1898], de Luís de Magalhães; O Poeta Saudade [1901], de Afonso Lopes Vieira). Os principais nomes do Neolusitanismo foram: Afonso Lopes Vieira, em cuja obra há a valorização de temas românticos da história, da simplicidade popular e infantil e versificação requintada; António Correia de Oliveira, em que sobressai o lirismo rural (Cantigas, 1902); Luís de Magalhães, em que avulta o desenvolvimento do mito sebástico, quer na figura histórica do Rei, quer na sua imagem moldada pela lenda popular segundo a qual D. Sebastião transfigura-se para assumir a alma nacional – como ocorre em “O Desejado” (1898), de António Nobre; Jaime de Magalhães Lima, em cuja obra evidencia-se o ruralismo, a reconversão religiosa e rural, a oposição à ideologia do progresso racional, científico-naturalista; António de Monforte, no qual há intenção de reconstruir o fundo psicológico da raça; e Trindade Coelho, autor fundamental do lusitanismo (Os Meus Amores, 1891), em que se sobressaem temas como o mundo da lavoura transmontana, a assimilação da linguagem popular rural à literatura, a religiosidade associada a racionalidade pequeno-burguesa fim-de-século, o liberalismo laico conservador etc. As principais revistas literárias dessa tendência foram Ilustração Portuguesa (1884-1890) e  Serões (1905-1911).

O Neolusitanismo obnubila-se no final da primeira década de Novecentos para acompanhar, depois, a afirmação saudosista. Na segunda década, a corrente lusitanista banaliza-se e tenta se aproximar, sem êxito, entretanto, ora do esteticismo modernista, ora do protopresencismo. Nessa conjuntura, ligam-se ao Neolusitanismo Afonso Lopes Vieira, António Correia d’Oliveira, António Sardinha, além de Mário Beirão, Afonso Duarte, Florbela Espanca, Américo Durão, Armando Cortes-Rodrigues, Carlos Cochofel, entre outros.

 

BIBL.: José Carlos Seabra Pereira, O Neo-Romantismo na Poesia Portuguesa (1900-1925), Universidade de Coimbra, Coimbra, 1999; id. «Reacção e compromisso no fim-de-século: o primeiro surto de tendências neo-românticas», in Máthesis 5, 1996, pp. 365-394; Óscar Lopes, Entre Fialho e Nemésio, Vol. I, Lisboa, Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1987.

 

 

Annie Gisele Fernandes