David Merrick é, como tantas outras, uma personagem de menor importância no conjunto das personalidades literárias de invenção pessoana, pois a sua “vida” foi passageira e pouco representativa na poesia inglesa deixada por Fernando Pessoa. O seu interesse reside apenas no facto de ter sido o “avô” literário de Alexander Search, ou seja, o precursor do que viria a ser o principal pré-heterónimo de Pessoa. Na cadeia das personagens, e na passagem de testemunhos e tarefas em que umas vão cedendo lugar às outras, temos um certo temperamento, gosto, visão e espírito encarnados, primeiramente em D. Merrick, depois em C. R. Anon, para finalmente culminar em A. Search, herdeiro dos outros que literalmente rasurou. No “caderno” de notas de Merrick, começado por ele em 1903, o seu nome aparece riscado e substituído em 1904 pela assinatura de C. R. Anon, que escreve nele a partir daí.
David Merrick, autor de projectos realizados mais tarde por Search e de alguns poemas anexados depois à sua obra, foi ambicioso nos seus planos de 1903, mas apenas deixou fragmentos, esboçando alguns escritos no campo da poesia, da ficção, da crítica literária e do drama. No que respeita a este género, escreveu não só em inglês, mas também em português, sendo-lhe atribuídos fragmentos da peça portuguesa “Inez de Castro” e do drama “Marino”, onde Fernando Pessoa, em voz alheia e em inglês, exprimiu pela primeira vez a pergunta essencial da sua vida: “Who am I?”
Luísa Freire