A revista Blast (1914-1915) foi fundada por Whyndham Lewis como órgão de propaganda dos ideais dos vorticistas, grupo de jovens artistas britânicos de vanguarda. Os seus dois únicos números, editados e elaborados principalmente por Lewis, com contribuições dos outros membros do grupo, ajudaram a promover o movimento Vorticista em geral, e a obra de Lewis em especial.
As primeiras vinte páginas de Blast I (Julho de 1914) constituem o Manifesto Vorticista, redigido por Lewis com a ajuda de Ezra Pound e assinado também por Edward Wadsworth, William Roberts, Helen Saunders, Lawrence Atkinson, Jessica Dismorr e Henri Gaudier-Brzeska. David Bomberg e Jacop Epstein, embora colaborassem na revista, não assinaram o manifesto. A revista publicou textos de Pound, Rebecca West e Gaudier-Brzeska, e um trecho do romance de Ford Madox Hueffer The Saddest Story (título provisório de The Good Soldier, posteriormente publicado sob o pseudónimo de Ford Madox Ford). Incluía ainda uma crítica feroz à arte contemporânea, poemas de T. S. Eliot (que não pertencia ao grupo), e vários desenhos no estilo vorticista da autoria de Jacob Epstein, Lewis e outros.
A capa de Blast I era côr-de-rosa, com o título em grandes letras pretas, em diagonal. Lewis utilizou uma série de inovações tipográficas agressivas para atrair a atenção do leitor; tais inovações teriam grande influência na arte gráfica europeia do século XX, inclusive na revista portuguesa Presença (1927-1940). O segundo número (Blast II ou Blast War Number, Julho de 1915), que na capa trazia um desenho vorticista de Lewis, incluía uma curta peça teatral de Pound e os poemas ‘Preludes’ e ‘Rhapsody on a Windy Night’ de T. S. Eliot. Gaudier-Brzeska, então combatente, contribuía com um artigo intitulado ‘Vortex (written from the trenches)’, escrito poucas semanas antes de ser morto. Blast I surgiu poucas semanas antes do início da guerra, e a publicação, um ano depois, do segundo número sucessivamente adiado, marcou o fim do movimento Vorticista, não obstante algumas tentativas por parte de Lewis e Pound de o reanimar alguns anos mais tarde.
Os dois números de Blast traziam ainda as famosas páginas dedicadas a ‘Blast’ (fazer explodir) ou ‘Bless’ (bem-dizer) as várias pessoas, ideias ou objectos sobre os quais os vorticistas quiseram opinar. A secção ‘Blast’ atacava, entre outras coisas, a França, que na época era considerada o centro do mundo artístico, Roger Fry, o organizador de duas influentes exposições de arte pós-impressionista em Londres, o Grupo de Bloomsbury, a generalidade dos críticos de arte e, por razão desconhecida, o bairro de Putney, zona de Londres onde alguns dos vorticistas viviam ou trabalhavam. Entre os ‘benditos’ estavam os cabeleireiros e os marinheiros, por lutarem contra as forças da natureza. Henry Tonks, professor de Slade School of Art onde vários membros do grupo vorticista se conheceram, teve a duvidosa honra de ser atacado e bendito no espaço de poucas linhas. Lewis e Pound estavam por trás da maioria destes fogos-de-vista literários, certamente inspirados na fórmula de Apollinaire ‘Rose à / Merde à’ em L’anti-tradition Futuriste (1913).
O Sensacionismo de Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro tem paralelos com o Vorticismo de Lewis e Pound. Além disso, Blast foi contemporânea do Orpheu, de que também apenas se publicaram dois números (Março e Junho de 1915). Pessoa possuía na sua biblioteca um exemplar de Blast I, e a revista era conhecida no seu círculo. Tal como a revista inglesa funcionou relativamente ao Vorticismo, Orpheu serviu, em certa medida, de máquina publicitária das ideias do grupo de Pessoa em geral, e do génio do Poeta em particular.
É impossível, também, não aproximar o estilo, tão humorístico quanto agressivo, das célebres páginas ‘Blast / Bless’, nas quais os vorticistas atacavam tudo e todos, do manifesto “Ultimatum”, da autoria de Álvaro de Campos, publicado no Portugal Futurista em 1917.
Bibliografia
Black, Jonathan (ed.). Blasting the Future: Vorticism and the Avant-Garde in Britain 1910-1920 (Londres: Phillip Wilson, 2004)
Cork, Richard. Vorticism and Abstract Art in the First Machine Age (Londres: Gordan Fraser, 1974)
Edwards, Paul (ed.). Blast: Vorticism 1914-1918 (Londres: Ashgate, 2000)
Mariana de Castro