Como outros artistas da sua geração, Bernardo Marques teve um trajecto polivalente, distinguindo-se nas artes gráficas e na decoração.

Viveu durante a infância e a adolescência no Algarve, num círculo familiar próspero e cultivado. Estudante da Faculdade de Letras de Lisboa, entre 1918 e 1921, integrou-se no meio cultural dos cafés do Chiado e envolveu-se informalmente na prática do desenho, acabando por abandonar o curso universitário. Em 1920, as revistas ABC e Ilustração Portuguesa começaram a publicar ilustrações e desenhos humorísticos da sua autoria. No mesmo ano, participou na III Exposição de Arte do Grupo dos Humoristas Portugueses. Estimulado por um acolhimento favorável, intensificou a sua produção e, ao longo das duas décadas seguintes, publicou em vários jornais e revistas: ABC, ABC A RIR, O Século, Europa, Diário de Notícias, Notícias Ilustrado, Ilustração, Sempre Fixe, Civilização, A Batalha, Diário de Lisboa (periódico onde manterá a interessante crónica Domingos de Lisboa), Revista Portuguesa, Contemporânea, Kino, Imagem, Presença, entre outros. Os desenhos que realizou na década de 20, de temática mundana, contornos simples e recortes planos, entraram em consonância com as expectativas da imprensa ilustrada e o imaginário cosmopolita que ia despontando entre as classes mais abastadas da capital. Em 1924, por convite de José Pacheko, realizou uma pintura para a primeira encomenda do café A Brasileira, no Chiado. Em 1929 viajou até Berlim. Nos anos seguintes, paralelamente ao trabalho de encomenda ou para a imprensa, realizou desenhos de inclinação expressionista e teor satírico (algo mitigado, tendo em conta o seu modelo, Georg Grosz). Em várias páginas soltas, retratou o serão familiar burguês, a boémia dos cafés, o açambarcador glutão, o ardina, os diplomatas, os militares, os académicos, os frequentadores do S. Carlos, a casa de fado, as cinéfilas, entre outras figuras urbanas. Estes desenhos foram expostos em 1930, no I Salão dos Independentes.

No mesmo ano, realizou os cenários para o filme Ver e Amar, de Chianca de Garcia (em 1936 seria co-autor, com Keil do Amaral, da cenografia para O Trevo de Quatro Folhas, do mesmo realizador).

Numa via distinta, trabalhou na decoração de pavilhões das representações do estado português: integrou o grupo encabeçado por Fred Kradolfer, na Exposição Colonial Internacional (Paris, 1931); colaborou no pavilhão português da Exposição Internacional de Paris(1937); nos pavilhões das Exposições Internacionais de Nova Iorque e São Francisco (1939); nos pavilhões Colonização, Vida Popular e Portugueses no Mundo, da Exposição do Mundo Português (Lisboa, 1940). Nesta vertente, apropriou e procurou modernizar motivos históricos, folclóricos e populares, enquadrando-se no modernismo de estado e no imaginário próximo da Política do Espírito, preconizada por António Ferro, (de quem foi vizinho e amigo próximo e para quem realizou algumas das capas mais interessantes da sua carreira: A Idade do Jazz Band, Mundo Novo ou Arco do Triunfo).

Em 1934, recebeu uma bolsa para estudar artes gráficas e fez uma estadia mais longa em Paris, produzindo novos registos da vida urbana, expostos na colectiva Pintores Portugueses e Brasileiros no Théâtre de l’Oeuvre e na Casa de Portugal. Ainda no mesmo ano, em Lisboa, colaborou com Kradolfer na decoração do cortejo fluvial para as Festas da Cidade.

Trabalhou também em publicidade, desenhando cartazes e folhetos para as empresas Spalding, Chás Namuli, SCIAL, Sociedade Portuguesa de Filmes, Bolachas Nacional, entre outras.

No início da década de 40 foi figurinista dos Bailados Verde Gaio e nos anos seguintes produziu muito na área da ilustração, desenho de capas e grafismo de livros, para diversas editoras (Guimarães, Inquérito, Estúdios Cor, Livros do Brasil, Ática, entre outras).

Foi director gráfico das revistas Panorama (1941-49), editada pelo Secretariado Nacional de Informação (SNI), Litoral (1944-45) e Colóquio (desde o primeiro número, em 1959, até ao final da vida). Em 1947, assumiu a direcção de arte da Editorial Ática.

Chefiou a decoração das três primeiras edições da Feira das Indústrias (1949-51) e pela mesma altura, recebeu encomendas de vários desenhos para decorações dos paquetes Vera Cruz e Santa Maria.

O seu desenho tornou-se mais fluído, feito de emaranhados de sinais e linhas, integrando a vegetação e os elementos naturais com a arquitectura, numa atenção crescente aos elementos da paisagem. Um dos momentos mais interessantes da sua obra gráfica – juntamente com as ilustrações do álbum póstumo, Saudade de Lisboa, coligido por David Mourão Ferreira –surgiu com os catorze desenhos do pequeno livro Lisboa, de Luiz Teixeira, uma publicação cultural da Câmara Municipal de Lisboa, editada em 1955.

Em 1957, participou na 1ª Exposição de Artes Plásticas da Fundação Calouste de Gulbenkian (na ocasião, foi-lhe atribuído o prémio Aguarela e Desenho).

Trabalhou até ao fim da vida e morreu em 1962, em Lisboa.

 

Bibliografia:

AAVV¸Bernardo Marques, obras de 1950 a 1960, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1966.

AAVV¸Bernardo Marques: période 1934-1962, Fundação Calouste Gulbenkian / Centro Cultural Português, Paris, 1982.

AAVV, Bernardo Marques 1898 – 1998 Obra Gráfica, Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1998.

 

RUIVO, Mariana Bairrão. Bernardo Marques, Editorial Presença, Lisboa, 1993.

 

 

 

Luís Henriques