É claro, meu querido Amigo, que lhe escrevo agora por dá cá aquela palha – pois o preço da estampilha é a miséria dum vintém!... O R. i R. emprestou-me o último n.o da Águia. Então agora o Vila-Moura também se quer ungir de Europa – de Paris! Mas logo põe uma dama tripeira no cabaret do Quat’s Arts (que nunca existiu, creio: Quat’s Arts é o baile dos pintores, escultores, arquitectos que se realiza todos os anos). Que trecho tão lepidóptero. Há-de ser uma beleza a novela!... E a página do G. Leal da senhora dos olhos mestos mas honestos. Aquilo só com um pau!... Que diz você?...
– O R. i R. tem em preparação um volume chamado Poesia e Prosa (2.a ed.) que é uma selecta de prosadores e poetas portugueses – aonde traduzirá versos meus. Pediu-me para lhe indicar outros poetas a traduzir. É preciso que o paulismo se manifeste, não lhe parece? Assim já pedi versos ao Guisado. E você? Você devia figurar também. Por lepidóptero que seja o R. i R. sempre traduz menos mal, parece-me, pelo que adivinhei, por exemplo, da «Elegia» do Pascoais nas Atlântidas, que – é claro – ele já me deu. Diga-me pois o que pensa sobre o assunto.
– O mesmo eterno R. i R. na sua lepidopteria pediu-me para eu escrever um artigo sobre O Génio Peninsular livro recém-aparecido em edição da Renascença. Não tenho remédio, é claro, senão escrevê-lo. Mas tem piada. Porque será publicado em Catalão no El Poble!... Seja como for sempre um pouco cosmopolita... Ah! e é claro que unjo o artigo de paulismo, olá se o unjo!...
Pelo mesmo correio mando-lhe um jornal de Bilbau, com artigos em basco. Repare-me para esse idioma, e diga-me se não dá bem a impressão duma língua Outra. É perturbador e misterioso – língua antiquíssma, de origens ignoradas, ignoradas, d’além-civilização. Eu acho impressionante! Escreva-me o mais depressa possível e largamente como fez nos primeiros meses! Suplico-lhe! Suplico-lhe. Conte-me coisas. E averigue-me sobretudo pelo Pacheco, o que há sobre o C. Franco.
Mil abraços do seu, muito seu
Mário de Sá-Carneiro
Escreva!
As cartas seguem borradas pois só amanhã tenho a minha caneta que foi a mudar de aparo! Diga se recebeu o jornal Outro. Escreva-me! Escreva-me! Averigue do Franco. Fale-me dessa gente, mesmo lepidóptera daí. Pergunte ao V. Braga se recebeu uma carta que lhe enviei para a Estação do Rossio. Mais saudades do
M. de Sá-Carneiro