Arquivo virtual da Geração de Orpheu

Mário de Sá-Carneiro

O Arquivo Mário de Sá-Carneiro (1890-1916), poeta modernista, inclui correspondência, cadernos e manuscritos, bem como a obra publicada no seu tempo de vida. Muitos destes documentos foram reunidos por François Castex, professor e escritor francês, e encontram-se conservados na Biblioteca Nacional de Portugal. Reúne-se aqui também o conjunto das cartas enviadas pelo autor ao seu amigo Fernando Pessoa.

Os documentos completos encontram-se no campo “PDF” e os manuscritos foram transcritos no campo “Edição”. 

 

Medium
Mário de Sá-Carneiro
Esp.115/6_56
Esp.115/6_56
Sá-Carneiro, Mário de
Identificação
Carta a Fernando Pessoa
Carta a Fernando Pessoa

Carta enviada de Paris, no dia 3 de novembro de 1915. 

 

 **

 

Paris – Novembro 1915

Dia 3

Meu Querido Amigo,

 

Recebi ontem a sua longa e interessantíssima carta de 29 out. que de todo o coração agradeço. Foi um grande prazer, tanto mais que o seu silêncio ou o seu laconismo estenderam-se ultimamente tanto que principiava a lembrar-me se você, por qualquer motivo astral, estaria zangado comigo.

Ilusão perfeita – claro. Mas um grande júbilo a sua interessantíssima carta.

O sarilho do Orfeu-Rita desopilante a todas as bandeiras despregadas. Mestre Rita Chefe de nós. Ui! é de arrebentar! Curioso constatar isto: não podendo fazer sair o nosso Orfeu, nem armar-se em nosso chefe – Santa-Rita, renuncia à sua revista. Combine isto com o à viva força ele querer ser servilmente futurista – e não «ele-próprio»... Curioso, não é verdade! Novidades, nenhumas.

Ideia jornal com Pacheco aplaudo a mãos ruidosas. Mas, monetariamente, será possível? Oxalá... Claro que você publica de mim os versos que quiser. Disponha como se fossem produções suas. Óptimo pateada a Dantas publicamente-gente-do-Orfeu. Óptimo! – Nesta carta vão duas poesias. Eu não sei o que aquilo é ou vale. Pleno destrambelho. A desarticulação sarcástica da minha alma actual: esboçada já na «Serradura» e «Cinco Horas». Veja-me o que dá o meu horóscopo actualmente. Interessa-me imenso. Faça o possível por o examinar – e não tenha receio de me dizer o que ele acusará.

Peço-lhe isto muito: Não se esqueça. Escreva-me rapidamente, por amor de Deus. Detalhe assunto jornal que muito me interessa. Abrace por mim o Pacheco e diga-lhe que não se esqueça de responder à carta que ultimamente lhe escrevi. O Franco deve vir em licença por todo este mês conforme carta recebida hoje. Diga isto ao Pacheco e que ele está bem e lhe pede para avisar a tia.

Quanto aos meus versos: francamente diga-me se valem alguma coisa. Se assim for – e como creio que farei mais do género – farão uma parte dos Indícios com o título de «Colete-de-Forças» ou «Cabanon». Escreva! Adeus.

Mil abraços e toda a Alma do seu, seu

Mário de Sá-Carneiro

P. S.

Decididamente parece-me que os versos não prestam para nada.

Quanto a negócios da Livraria nada tenho a adiantar à minha última carta. Nos últimos dias deste mês (ou mesmo nos 1.os de Dezembro) preciso receber o mais dinheiro possível: todo seria o ideal. Vá em todo o caso falando já disto ao Augusto, a quem qualquer dia escreverei.

Mais saudades. Escreva.

o Sá-C.

 
https://modernismo.pt/index.php/arquivo-almada-negreiros/details/33/5683
Classificação
Espólio Documental
Correspondência
Dados Físicos
Tinta preta sobre papel liso e sobrescrito.
Dados de produção
1915 Novembro 3
Inscrita.
Fernando Pessoa
Português
Dados de conservação
Biblioteca Nacional de Portugal
Bom
Biblioteca Nacional de Portugal
Palavras chave
Paris
Orpheu, Futurismo, Modernismo
Documentação Associada
Sá-Carneiro, Mário de, Cartas de Mário de Sá-Carneiro a Fernando Pessoa, ed. Manuela Parreira da Silva, Assírio & Alvim, Lisboa, 2001.
Esp.115
Na transcrição das cartas: a ortografia foi actualizada e as gralhas evidentes corrigidas, mantendo, contudo, as elisões com apóstrofo e todas as singularidades da pontuação usada por Mário de Sá-Carneiro, bem como a forma original das datas, muitas vezes com o nome dos meses em letra minúscula ou abreviado. O título da revista Orpheu foi mantido na forma sempre usada por Sá-Carneiro – Orfeu. Foram mantidas, igualmente, as versões de versos e de outros trechos literários mais tarde corrigidos ou refundidos pelo poeta.