Arquivo virtual da Geração de Orpheu

Mário de Sá-Carneiro
Medium
Mário de Sá-Carneiro
Esp.115/6_34
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Sá-Carneiro, Mário de
Identificação
Carta a Fernando Pessoa
Carta a Fernando Pessoa

Carta enviada de Paris, no dia 13 de Agosto de 1915. 

 

 **

Paris – Agosto 1915

Dia 13 = 6.ª-feira.

 

Meu Querido Amigo,

 

Recebi a sua carta de 9 que muito do coração agradeço. Quanto à minha deplorável de 2 já lhe supliquei de joelhos mil perdões – e acho inútil voltar ao assunto. No entanto ainda uma vez me ajoelho diante de você – «S. Fernando Pessoa», lembra-se, como eu lhe chamava o ano passado – a implorar-lhe a sua absolvição. Posso contar com ela, não é assim? Óptimo então.

– Francamente tenho muito pouco a dizer-lhe neste dia astrologicamente terrível de sexta-feira e 13. Mas a propósito: Sabe que me está deveras assustando o tal sarilho do atravessamento do Sol em mau aspecto lunar? E por isto: é que as coisas me estão correndo muito razoavelmente. Com efeito veja este exemplo (e não lhe posso dar outro melhor visto tratar-se de «finanças»): esperava 40 francos da Livraria – 50 que pedira ao meu avô. Pois bem: da livraria, recebi 60 – do meu avô, 100... E eu receio mais, palavra, quando as coisas me correm bem do que quando me seguem mal! O que peço a você – não tenha receio em dizer-me, por amor de Deus – é que se debruce mais sobre os meus Astros e veja as circunstâncias que vão actuar no meu destino dos próximos meses. Quanto mais não seja para exercermos um controle que será muito interessante. Quando tiver pachorra rogo-lhe pois que se debruce – e não hesite em me informar. Combinado? Muito bem, você é um anjo.

– Na galeria Sagod, o templo cubista futurista de que lhe falei já numa das minhas cartas comprei ontem um volume: I Poeti Futuristi. É uma antologia abrangendo o Marinetti e muitos outros poetas: Mario Bétuda, Libero Altomare, etc., etc. Em acabando de ler o catrapázio (1 semana) vou-lho mandar em presente. Já lá descobri uns Fu fu... cri- -cri... corcurucu... Is-holá..., etc. muito recomendáveis. Vamos a ver... A propósito: não se esqueça por princípio nenhum de mandar com brevidade dois exemplares do Orfeu (ou 3) para o movimento futurista. A propósito: não haveria meio de saber se ainda existe – ou apenas está interrompida pela guerra – a revista internacional de literatura Poesia dirigida pelo Marinetti e, segundo anúncio incerto no volume que ontem comprei, colaborada por italianos, franceses, belgas, espanhóis e ingleses. De resto por passeiístas e futuristas: Annunzio e Verhaeren colaboraram por exemplo. Pode, por exemplo, mandar vir à minha conta pela livraria um ou dois n.os. Isso é com você. Mas estas linhas servem de ordem para o Augusto – se você quiser. Se a revista existisse – nós poderíamos muito possivelmente ser colaboradores. Por tudo isto, não deixe de enviar o Orfeu aos homenzinhos.

– Outro pedido: telefone já ao Vitoriano agradecendo-lhe muito da minha parte o seu cuidado – mas lamentando que não me tivesse ainda escrito um postal. Não deixe de lhe telefonar – e mil agradecimentos. Adeus. Nunca se esqueça de mim! ESCREVA SEMPRE! Um grande abraço d’alma.

o seu, muito seu
Mário de Sá-Carneiro

P. S. Se não arquivou a coupure do D. de Notícias diga-me, que lha devolvo.

 

 
https://modernismo.pt/index.php/arquivo-almada-negreiros/details/33/5563
Classificação
Espólio Documental
Correspondência
Dados Físicos
Tinta preta sobre folha lisa e sobrescrito.
Dados de produção
1915 Agosto 13
Inscrita.
Fernando Pessoa
Português
Dados de conservação
Biblioteca Nacional de Portugal
Bom
Biblioteca Nacional de Portugal
Palavras chave
Paris
Documentação Associada
Sá-Carneiro, Mário de, Cartas de Mário de Sá-Carneiro a Fernando Pessoa, ed. Manuela Parreira da Silva, Assírio & Alvim, Lisboa, 2001.
Esp.115
Na transcrição das cartas: a ortografia foi actualizada e as gralhas evidentes corrigidas, mantendo, contudo, as elisões com apóstrofo e todas as singularidades da pontuação usada por Mário de Sá-Carneiro, bem como a forma original das datas, muitas vezes com o nome dos meses em letra minúscula ou abreviado. O título da revista Orpheu foi mantido na forma sempre usada por Sá-Carneiro – Orfeu. Foram mantidas, igualmente, as versões de versos e de outros trechos literários mais tarde corrigidos ou refundidos pelo poeta.