Virtual Archive of the Orpheu Generation

Mário de Sá-Carneiro

The Virtual Archive of Mário de Sá-Carneiro (1890-1916), modernist poet, includes his correspondence, notebooks, manuscripts and published work during his lifetime. Most of these documents were gathered by François Castex, French intellectual, and are kept at the National Library of Portugal. Also included here are letters sent by the author to his great friend Fernando Pessoa.

The full documents can be found in the 'PDF' box and the manuscripts have been transcribed in the 'Edition' box. 

 

 

Medium
Mário de Sá-Carneiro
Esp.115/5_25
Esp.115/5_25
Sá-Carneiro, Mário de
Identificação
Carta a Fernando Pessoa
Carta a Fernando Pessoa

Carta enviada de Paris, no dia 17 de Agosto de 1914. 

 

 **

Paris – Agosto de 1914

Dia 17

Meu Querido Amigo,

 
Estou muito preocupado, muito enervado com o seu inexplicável silêncio de há mais de 15 dias! Ter-lhe-ia acontecido alguma coisa de gravidade? Não sei – e isso ainda mais me preocupa. Em todo o caso, sabendo o meu querido Pessoa como a incerteza é dolorosa para mim parece impossível que não me escrevesse ainda – nem me telegrafasse acusando a recepção da minha carta registada. Creia que fez muito mal em proceder assim fossem quais fossem as circunstâncias. Eu não me zango com você por ainda não ter recebido o dinheiro apesar da falta que ele me faz. Zango-me apenas – e muito, pela sua inadmissível falta de notícias. Tenho recebido cartas de Lisboa apenas com 1 dia de atraso – e ainda há 4 dias recebi uma carta do Guisado, também quase sem atraso. Assim não lhe posso desculpar o seu silêncio. Creia que o meu querido Amigo me tem feito mal – e, sobretudo, tem sido injusto para comigo. De resto o meu afecto por si é grande em demasia para eu não esquecer tudo isto. Mas, por amor de Deus, em nome justamente desse afecto – dê-me notícias suas (se possível por telégrafo) logo que receber esta carta. Imploro-lhe como um dever. Ofender-me-ia muito se continuasse sem me dar notícias suas. Imploro-lhe!...

Vai juntamente uma poesia que ontem concluí «Taciturno» (numa acepção paralela à dos «nocturnos» em música ou poesia). Diga-me a sua impressão – e o que é preferível: se manter o verso

«Veladas d’armas ainda em arraiais d’olvido»
um tanto incorrecto quanto a metrificação pois é preciso contar o ainda como 2 sílabas – ou trocá-lo por este, certo

«Manhãs d’armas ainda em arraiais d’olvido»
De resto o 1.o soa-me bem e acho-o talvez mais belo.

Mas você dirá!

É muito possível, mesmo certa, a minha próxima partida para Lisboa! Escrevo ao mesmo tempo a pedir dinheiro para o meu regresso imediato – e, para Lourenço Marques, ao meu Pai, pedindo-lhe para ir para o pé dele. Vê, as minhas resoluções...

Estou muito triste, muito triste! Tenha dó de mim!

Dê-me notícias suas com a maior urgência.

E receba mil abraços, mil saudades do seu, muito seu

Mário de Sá-Carneiro

Em todo o caso não conto chegar a Lisboa antes dos primeiros dias de Setembro.

Dê-me notícias suas!...
Enviei-lhe um telegrama no dia 15.

https://modernismo.pt/index.php/arquivo-almada-negreiros/details/33/5754
Classificação
Espólio Documental
Correspondência
Dados Físicos
Tinta preta sobre folhas lisas e sobrescrito timbrado.
Dados de produção
1914 Agosto 17
Inscrita.
Fernando Pessoa
Português
Dados de conservação
Biblioteca Nacional de Portugal
Bom
Biblioteca Nacional de Portugal
Palavras chave
Paris
Documentação Associada
Sá-Carneiro, Mário de, Cartas de Mário de Sá-Carneiro a Fernando Pessoa, ed. Manuela Parreira da Silva, Assírio & Alvim, Lisboa, 2001.
Esp.115
Na transcrição das cartas: a ortografia foi actualizada e as gralhas evidentes corrigidas, mantendo, contudo, as elisões com apóstrofo e todas as singularidades da pontuação usada por Mário de Sá-Carneiro, bem como a forma original das datas, muitas vezes com o nome dos meses em letra minúscula ou abreviado. O título da revista Orpheu foi mantido na forma sempre usada por Sá-Carneiro – Orfeu. Foram mantidas, igualmente, as versões de versos e de outros trechos literários mais tarde corrigidos ou refundidos pelo poeta.