E mesmo de Lisboa, telegramas: Portugal mobilizará 10 mil homens em vista da aliança inglesa. Por mim estou ansioso e desoladíssimo neste momento. O meu Pai já ontem me telegrafou de L. Marques a dizer-me que era melhor voltar para Lisboa. Respondi-lhe que valia ainda esperar. A cada passo entretanto receio ter que partir por ordem dele – ou mesmo forçado pelas circunstâncias. Seja como for só partirei em últi- mo caso. Estou muito triste! De resto, embora os perigos, eu gostaria veementemente de viver esta guerra da Europa em Paris. Mas não sei, nada, nada...
– Recebi hoje a sua carta se 28 que muito agradeço e achei interessantíssima. Parece impossível que você receie maçar-me com o que nela diz!... Sobretudo entusiasmou-me a sua teoria da «República Aristocrática» – que creio ter perfeitamente compreendido. E entusiasmou-me muito alto – por o «paulismo» lhe ser um forte apoio. Cada vez me vanglorio mais de pertencer a essa escola – e mais creio nela: mais creio em você – mais creio em mim. Que belíssima coisa seria agora com essa orientação «total» a nossa revista – Europa! – Curiosíssima a atmosfera de Paris entre estes acontecimentos. Toda a gente passa na rua, sombria, preocupada: e a mesma compreensão do perigo todos sobressalta. Há, sinto em verdade – não apenas por literatura – qualquer coisa a mais no ambiente tremulante (devido em «ra- cional» por certo, aos meus nervos de inquietação), o movimento dos veículos parece outro, mais contínuo – mais soturno... Enfim, qualquer fluido ondeia na atmosfera além do ar – tenho, em sinceridade, essa impressão. E lembro-me – agora por literatura – que em verdade a força psíquica de toda a gente pensando na mesma coisa – de tanto cérebro com a mesma preocupação profunda, de igual sentido, de iguais inflexões – poderia, deveria presumivelmente criar na atmosfera envolvente qualquer coisa de subtil... Isto seria uma crónica interessante a desenvolver... uma crónica, sabido, laivada de interseccionismo.
Recebi também carta do Guisado com as duas poesias a que você se refere. Magníficas. Mas concordo muito com o que o meu Amigo diz na sua carta sobre as deficiências, ainda, do Guisado. Também ontem me chegaram versos do C. Rodrigues: «Odes proféticas» que são belas, – entanto muito menos as senti do que a maioria dos seus versos.
– Desculpe não prolongar esta carta mais. Mas o meu terrível estado de espírito não mo permite, nesta onda de calor que, de mais a mais, hoje caiu sobre Paris. E oxalá não seja esta a última vez que eu lhe escreva daqui.