Virtual Archive of the Orpheu Generation

Mário de Sá-Carneiro

The Virtual Archive of Mário de Sá-Carneiro (1890-1916), modernist poet, includes his correspondence, notebooks, manuscripts and published work during his lifetime. Most of these documents were gathered by François Castex, French intellectual, and are kept at the National Library of Portugal. Also included here are letters sent by the author to his great friend Fernando Pessoa.

The full documents can be found in the 'PDF' box and the manuscripts have been transcribed in the 'Edition' box. 

 

 

Medium
Mário de Sá-Carneiro
Esp.115/6_41
Esp.115/6_41
Sá-Carneiro, Mário de
Identificação
Bilhete-postal a Fernando Pessoa
Bilhete-postal a Fernando Pessoa

Bilhete-postal enviado de Paris, no dia 6 de Setembro de 1915. 

 

**

M. de Sá-Carneiro

Paris 6 setembro 1915

 

«Serradura»

 

A minha vida sentou-se
E não há quem a levante,
Que desde o Poente ao Levante

A minha vida fartou-se.

 

E ei-la, a mona, lá está

Estendida – a perna traçada –

No infindável sofá
Da minha alma estofada.

 

Pois é assim: a minh’Alma

Outrora a sonhar de Rússias,

Espapassou-se de calma
E hoje sonha só pelúcias...

 

Vai aos Cafés, pede um boc,

Lê o Matin de castigo –
E não há nenhum remoque

Que a regresse ao Oiro antigo!

 

Dentro de mim é um fardo

Que não pesa mas que maça:

O Zumbido dum moscardo,

Ou comichão que não passa...

 

Folhetim da Capital
Pelo nosso Júlio Dantas,
Ou qualquer coisa entre tantas

Duma antipatia igual...

 

O raio já bebe vinho,

Coisa que nunca fazia,

E fuma o estuporinho

Pende prà burocracia...

 

Qualquer dia pela certa

Quando eu mal me precate,

É capaz dum disparate
Se encontra a porta aberta...

 

Pouco a pouco vai-se embora

Tudo quanto nele havia
Que tinha alguma valia

– Manteiga que se dessora.

 

Isto assim não pode ser...

Mas como achar um remédio?

– Pra acabar este intermédio

Lembrei-me de endoidecer:

 

O que era fácil – partindo

Os móveis do meu hotel,

Ou para a rua saído
De barrete de papel

 

Gritando «Viva a Alemanha!»

Mas a minh’Alma em verdade

Não merece tal façanha,
Tal prova de lealdade,

 

Vou deixá-la – decidido –

Num lavabo dum café

Como um anel esquecido.

É um fim mais «raffiné»...

 

https://modernismo.pt/index.php/arquivo-almada-negreiros/details/33/5668
Classificação
Literatura, Espólio Documental
Correspondência, Poesia
Dados Físicos
Tinta preta sobre bilhete-postal.
Dados de produção
1915 Set 6
Inscrita.
Fernando Pessoa
Português
Dados de conservação
Biblioteca Nacional de Portugal
Bom
Biblioteca Nacional de Portugal
Palavras chave
Paris
Documentação Associada
Sá-Carneiro, Mário de, Cartas de Mário de Sá-Carneiro a Fernando Pessoa, ed. Manuela Parreira da Silva, Assírio & Alvim, Lisboa, 2001.
Esp.115
Na transcrição das cartas: a ortografia foi actualizada e as gralhas evidentes corrigidas, mantendo, contudo, as elisões com apóstrofo e todas as singularidades da pontuação usada por Mário de Sá-Carneiro, bem como a forma original das datas, muitas vezes com o nome dos meses em letra minúscula ou abreviado. O título da revista Orpheu foi mantido na forma sempre usada por Sá-Carneiro – Orfeu. Foram mantidas, igualmente, as versões de versos e de outros trechos literários mais tarde corrigidos ou refundidos pelo poeta.