Peço-lhe muita atenção para esta carta – que de resto não vai ter nenhuma importância nem dar-lhe nenhuma maçada. Sossegue por consequência. Em primeiro lugar: do que se possa ter aí passado com respeito a questões da minha vida particular, comunico-lhe que não quero saber coisa nenhuma, tenha havido o que houver. Suplico-lhe como um dos maiores obséquios que se porventura sabe alguma coisa a esse respeito, se o foram mesmo procurar – o que é muito natural – etc., me não diga nada, nem faça de longe referências. É pelo sossego do meu espírito que lhe suplico este favor encarecidamente. Você bem compreenderá o que ele para mim representa. Não quero saber nada, absolutamente nada. E peço-lhe que não se refira sequer nas suas cartas a estas minhas linhas. Faça como se nenhuma destas trapalhadas tivesse existido. Fale-me só de si, de questões literárias, do Orfeu etc.!
Compreende bem, não é verdade? Por mim creio de resto as coisas a razoável caminho e estou tranquilo no momento em que lhe escrevo. Escrevi ontem uma longa e importantíssima carta ao meu Pai. Antes de receber a resposta a essa carta não sairei de Paris nem comunicarei o meu endereço a ninguém. Nem mesmo a você. Perdoe-me. Mas é capital para a minha vida que ninguém, absolutamente ninguém saiba aonde eu moro em Paris antes do meu Pai receber a minha carta e me responder. Até lá tenho dinheiro. O endereço mesmo que lhe vou pôr no fim da carta é absolutamente confidencial e só a você por enquanto o comunico. Isto porque não quero receber cartas desnecessárias e que só me viriam incomodar. Não irei mesmo à Posta Restante Central, perguntar por elas. Em nome da sua amizade lhe rogo por consequência que oculte mesmo a todos o endereço que lhe vou dar. Aos outros dirá que eu me esqueci de lhe mandar o endereço. Enviar-lhe-ei amanhã o postal que em tempos combinámos. Ao Pacheco e ao Vitoriano se me quiserem escrever, encarregue-se você de subscritar as cartas – mas evite o mais possível de lhes dizer o endereço que lhe vou dar – muito especialmente ao Vitoriano. Juro-lhe que nada de importante há sobre tudo isto. Trata-se apenas de ganhar Paris, de lutar pela minha vida – e do meu sossego de espírito. Outro assunto importantíssimo: Escrevi hoje ao Augusto (da Livraria) para – como de resto combináramos – ele promover a venda do Céu em Fogo até ao fim deste mês de forma que eu receba a importância sem falta até 8 de agosto. Vá falar com ele neste sentido daqui a um ou dois dias, e veja o que ele responde. Mas isso sem falta. Pergunte-lhe também, em meu nome como vai a venda do Orfeu. Diga-lhe que, se quiser, pode vender os Céus em Fogo imediatamente. Cinco exemplares em bom estado guarde-os para mim. Não se esqueça de lhe dizer isto – porque eu esqueci-me de lho dizer na minha carta. Informe-me de quando o negócio será feito. Tornarei a escrever ao Augusto a dizer-lhe que compre um cheque – que você subscritará para mim em carta registada. Sobre a primeira parte desta carta – mesmo sobre toda esta carta – suplico-lhe o maior sigilo. Conto dever-lhe todos estes obséquios. Breve escreverei uma longa carta sobre Paris que está emocionante à noite.