Carta a Fernando Pessoa, enviada de Paris, a 3 de Maio de 1913.
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São 9 e meia da noite.
Acabo de fazer isto num café. Diga o que vem a ser isto:
Numa ânsia de ter alguma cousa,
Divago por mim mesmo a procurar.
Desço-me todo em vão, sem nada achar,
E a minha’alma perdida não repousa.
Nada tendo, decido-me a criar:
Brando a espada, sou luz harmoniosa
E chama genial que tudo ousa
À força unicamente de sonhar.
Mas a vitória fulva esvai-se logo,
E cinzas... cinzas só, em vez de fogo...
Onde existo, que não existo em mim?...
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Um cemitério falso sem ossadas,
Noites de amor sem bocas esmagadas -
Tudo outro espasmo que princípio e fim...
3 maio 1913 – Paris
Pelo mesmo correio vai uma carta.