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Fernando Pessoa
Cota
BNP/E3, 14-4 – 97-99
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[Sobre a literatura inglesa e francesa]
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Autor
Fernando Pessoa

Identificação

Titulo
[Sobre a literatura inglesa e francesa]
Titulos atríbuidos
Edição / Descrição geral

[BNP/E3, 144 – 97-99]

 

Sempre no analítico dos ingleses há qualquer coisa de sintético; sempre no sintético do francês há qualquer coisa de analítico. Para o francês, no mesmo momento em que concebe um carácter e literariamente o manifesta, esse carácter está sendo analisado pela criada dele. Na própria síntese é uma análise imanente.

Veja-se o íntimo método |psíquico| de Flaubert. A cuidada análise, de “Madame Bovary” por exemplo, dá o resultado de |*penumbras| que o espírito do seu autor trabalha, quanto à psicologia dos seus caracteres, do se-

 

[98r]

 

guinte modo: concebe analiticamente, e nos seus elementos componentes cada carácter, e depois, por uma reconstrução mais ou menos inconsciente torna com os elementos da primitiva análise a reconstituir a individualidade. Por isso as figuras de Flaubert têm uma interioridade de realidade interior que nem as de Shakespeare ou as de Fielding têm. As destes têm a realidade do ente vivo; compreendemo-los na proporção em que compreendemos os entes vivos, apenas mais possivelmente por termos escrito o que disseram

 

[97v]

 

e não fugitivas palavras. Em Molière e Flaubert, ao contrário, o relevo psíquico dos caracteres é superior ao da vida. A análise íntima e imanente torna-lhes o invólucro psíquico mais transparente de modo a deixar ver, com mais realce do que na vida realmente há, o manobrar das suas almas. O pensar e sentir, as variações do pensar e sentir na alma de Alceste, por exemplo, são absolutamente visíveis. Em Shakespeare e Fielding não é assim – especialmente em Shakespeare, porque o drama é mais objectivo do que o romance. Nestes

 

[98v]

 

criadores há exacta e perfeitamente a realidade; são por isso mais perfeitos como artistas, ainda que[1] mais espontâneos e naturais. Concebem o carácter directamente, ou indirectamente; vêem as pessoas mover-se-lhes no espírito. Nem sequer lhes é necessário curar se a compreendem ou não; objectivam-na e a personagem sai real. O francês precisa compreender primeiro, para depois objectivar.

Musset, por exemplo, o maior e o mais intimamente representativo do génio francês; que de analítico evidentemente não é.

 

[99r]

 

Resumindo, o espírito inglês, é sintético; o francês |sintetizante|.

O próprio Victor Hugo, espírito em aparência pouco analítico, também é pouco sintético. Nem atinge eu creio a realidade sintetizante nem analisante. É um retórico; mas um retórico é mais analítico do que um sintético, especialmente um retórico como Victor Hugo e os |retóricos| do soneto francês; porque a sua retórica onanista era um desdobrar de uma ideia nos seus elementos imaginativos, imagens, etc, espremendo-a superficialmente. (A retórica de Pope e Burke é desta ordem)

 

 

[1] ainda que /como são\

Notas de edição
Identificador
https://modernismo.pt/index.php/arquivo-almada-negreiros/details/33/4649

Classificação

Categoria
Literatura
Subcategoria

Dados Físicos

Descrição Material
Dimensões
Legendas

Dados de produção

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Idioma
Português

Dados de conservação

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Biblioteca Nacional de Portugal
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