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Fundo
Fernando Pessoa
Cota
BNP/E3, 14-4 – 29-32
Imagem
[sobre Fernando Pessoa – ortónimo]
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Autor
Fernando Pessoa

Identificação

Titulo
[sobre Fernando Pessoa – ortónimo]
Titulos atríbuidos
Edição / Descrição geral

[BNP/E3, 144 – 29-32]

 

No fundo, o que eles todos precisam é – além de aprender português – de ter uma vida sexual normal, de trabalhar, de lidar com gente que nunca viu o seu nome impresso, de {…}

 

Algum deles que acaso leia este opúsculo, medite no que lhe digo, e não duvide da minha sinceridade. Se me ler, é em nome da arte que lhe peço que transmite o meu conselho aos seus camaradas.

Os meus conselhos são poucos e simples. Dividi-los-ei, em homenagem ao sr. Fernando Pessoa, que divide tudo em 3 partes (colocando 1 2 3) em artísticos, sociais, e individuais.

Os artísticos são – que aprendam bem português, que leiam os clássicos {…}

 

Os individuais – que usem de mulher com regularidade e sem timidez. A mulher nada é de realmente terrível. E, mesmo como coisa estética, espasmo por espasmo, é preferível decerto o que se divide com uma companheira bela e sadia do que o que se provoca a si-próprio. Se alguns dos meus visados nunca experimentaram o contraste, creiam que devem orientar a sua vida para o experimentar o mais depressa possível. Creiam que uma vez feito isso, deixarão de achar graça a seios dourados, a {…}

 

[30r]

 

Tudo isto acontece ao pobre rapaz (Fernando Pessoa) porque ele não está habituado a raciocinar senão, naturalmente, |para as tábuas do tecto do seu quarto|[1]. Não tem a noção de como outras pessoas possam encarar o que ele expõe. Apesar de ser da geração dos que andam sempre a afastar-se de si próprios, dos que têm gonzos na alma para fins de um desdobramento constante, não lhe ocorre desdobrar-se para normal.

 

Mas o facto é que nenhum destes jovens possui a suficiente noção da “gente” da “vida” para saber encarar, ao escrever, o efeito da sua própria obra.

_______

Já se não pode tão categoricamente escrever “onanismo” por baixo dos trechos de má prosa que constituem, por enquanto, a “obra” do sr. Fernando Pessoa. À psique deste indivíduo é muito difícil de definir, não é, se a expressão se permite, por assim dizer, solúvel em {…}. A razão é esta. Ainda que má prosa e mau raciocínio sejam os artigos “messiânicos”, e má prosa e falsa arte seja a Floresta do Alheamento,

 

[31r]

 

não se pode deixar de reparar no facto anormal – muito anormal mesmo – da extraordinária falta de semelhança entre os dois géneros de “literatura”? Confesso ter, ao princípio, hesitado em acreditar na idêntica autoria de um e outro. Mas uma análise fraseológica habilitou-me a ter por legítima a identidade das assinaturas.

No sr. Fernando Pessoa o que há é, não tanto onanismo físico, mas uma espécie de onanismo psíquico. A sua histeria é patente no desdobramento da individualidade de que falamos há pouco. Outro elemento notável é a atmosfera de cansaço que envolve a Floresta. Pode ser, é certo, que esse cansaço seja pura pose[2]. No artigo de abertura de uma secção Balança de Minerva num semanário casual de Lisboa, este mesmo autor põe-se em pose diante dos leitores. Não é por isso difícil de crer que de pura pose[3] seja a Floresta e o seu tédio. É isso mesmo que sou levado a crer pela observação, que já fiz, da histeria deste autor. Na histeria o desdobramento e {…} de personalidades diversas envolve – como é aliás evidente – uma[4] falsidade de cada uma dessas individualidades.

 

[31v]

 

No teorista do super-Camões há um real poder de raciocinar, mas totalmente desvirtuado, cuspido da quadriga da Lógica. Um raciocínio apressado, que salta os obstáculos, em vez de os remover, {…}

 

Veja-se para verificar quanto as qualidades (que já dissemos crer verdadeiras) de raciocínio do sr. Fernando Pessoa são viciadas por defeitos fundamentais do seu espírito, este parágrafo, que fecha um assaz miúdo raciocínio, no qual porém, a lucidez é futilidade em toda a extensão do |desenvolvido|, pela pressa em {…}

 

_______

Aqui há uma confusão entre raciocínio e sentimento. O cérebro não resiste mais a mantê-los à parte. Com um curioso impulso deixa-os abraçar em público. Nesta manifestação de raciocínio sente-se o cérebro degenerado que não pode com o peso da lógica que quer ter e se deixa cair sob o fardo, de repente, num gesto de abatimento completo. E sente-se também a pressa, a preia de “acabar”, do débil cuja atenção não quer ter o trabalho de lhe acompanhar e apertar os raciocínios, e a quem falta o equilíbrio para meditar profundamente um assunto e só

 

[32v]

 

escrever sobre ele quando o tem pronto “na cabeça”. Perguntando a alguém a † quando {…}

_______

 

  1. O romantismo português.

Do romantismo até nós a situação da sociedade portuguesa pode descrever-se como sendo uma perpétua série de soluções erradas para problemas, de si mal expostos.

Desde o fenómeno “constitucionalismo” até ao fenómeno “Renascença Portuguesa” não temos feito senão resolver problemas de que não tínhamos a noção completa (e, portanto lúcida) mediante[5] soluções que nem sequer com o problema, como[6] mal-exposto por nós, condizem.

 

[31v]

 

Considerações psiquiátricas sobre a

nova literatura portuguesa.

_______

Capítulo I. Psiquiatria e crítica literária.

 

Há dois géneros de degenerescência que interessam à literatura

(a) Degenerescência dos meios de expressão

(b) Degenerescência da base da inspiração

 

[32r]

 

Características da masturbação na literatura:

(1) Desdobramento do eu. Onde existe desdobramento do eu, existe, ou existiu e ficou gravada a masturbação.

(2) Sentimento para consigo próprio como para com outros. Desprezo ou ternura para si próprio – no 1º caso, a tendência é para faltar outro, no 2º para lhe possuir.

(3) O destrambelhamento das imagens, a inatenção aos ritmos, a precipitação na forma, parecendo que se está gritando.

 

 

______________________________________________________

A renascença[7] mística do séc. XX marca uma cristalização daqueles eleitos religiosos que são precisamente os que constituem a parte mórbida da religião.

 

 

[1] ← stray

[2] pose /atitude\

[3] pose /atitude\

[4] uma /a\

[5] mediante /procurando\

[6] como /ainda que\

[7] renascença /regressão\

Notas de edição
Identificador
https://modernismo.pt/index.php/arquivo-almada-negreiros/details/33/4599

Classificação

Categoria
Literatura
Subcategoria

Dados Físicos

Descrição Material
Dimensões
Legendas

Dados de produção

Data
Notas à data
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Dedicatário
Destinatário
Idioma
Português

Dados de conservação

Local de conservação
Biblioteca Nacional de Portugal
Estado de conservação
Entidade detentora
Historial

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Documentação Associada

Bibliografia
Publicações
Fernando Pessoa, Obra Completa de Ricardo Reis, edição de Jerónimo Pizarro e Jorge Uribe, Lisboa, Tinta-da-China, 2016, pp. 342-344; 488-489.
Exposições
Itens relacionados
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