Imprimir

Medium

Fundo
Fernando Pessoa
Cota
BNP/E3, 14-2 – 14-15
Imagem
[Sobre poesia e arte]
PDF
Autor
Fernando Pessoa

Identificação

Titulo
[Sobre poesia e arte]
Titulos atríbuidos
Edição / Descrição geral

[BNP/E3, 142 – 14-15]

 

Na “Elegia”, estava como que concentrado, fechado naquele melhor, todo o amor que disse ser derramado pela Natureza-Deus.

 

 

O vago dos simbolistas não é o vago dos místicos. Místico era Victor Hugo, não Verlaine, ou Mallarmé, ou {…} – tão mais vago do que ele (|Nada errou|) O simbolista é um poeta de imaginação, não de pensamento.

 

[14v]

 

Antenota.

|Traz este livro de versos, pelo menos em alguns pontos – e nalguns desses flagrantemente –, inovações estranhas e estranháveis para a poesia, {…}

 

Chegada à sua máxima complexidade de ideação moderna precisa de um instrumento de expressão maximamente complexo.

 

 

Para quem tem emoções complexas a exprimir, a gramática e a lógica existem secundariamente. É lógico e natural que aquela poesia que se baseia em sentimentos naturais e simples use uma linguagem natural e normal.

 

Mas a poesia que for complexa?

_______

Como as obras líricas de Hugo.

_______

Crónicas Anormais

Considerações metafísicas, para uso mesmo daqueles que as não compreenderem.

Todos os dias, ao andar, pesa sobre mim o espanto infantil de encontrar o universo. É tão estranho, meus amigos, que existam coisas, e que a gente julgue que elas existam[1]! Eu não afirmo – repare-se – que elas existem realmente! Mas elas aí estão, como o seu quê e ali, tão absurdamente candidatas a ser[2] tomadas por reais.

 

[14ar]

 

A pintura, a escultura, a arquitectura não são arte.

Na Era da “arte” da “ruptura” etc. vendo falar dá vontade de nos calarmo-nos.

Desinteressamo-nos de tudo isso.

_______

À parte, e o {…} são distintas de indivíduos que não têm mais que fazer {…}

______________________________________________________

O tédio difere do aborrecimento. (Como a preguiça da abulia. Uma coisa contém o sentimento de poder e querer sair dele, a visão do contrário. O tédio não, penetra até ao sonho) (Como uma fúria de zangar, de um acesso de loucura.)

_______

A distracção? Nunca.

______________________________________________________

As Três Portas da Cidade

Há só três coisas que libertam do burguesismo, da banalidade: o tédio, o misticismo, o raciocínio – um porque acha tudo oco, outro porque acha a tudo constantemente um outro e íntimo sentido, e o terceiro porque destrói tudo e da alma nos serve análises ininterruptas, e construi por síntese e interpretação o analisado.

A arte não: o burguês gosta do belo. Um belo inferior? Sim, porque lê e gosta do belo. (Gostar do feio foi, então, um modo de revolta contra o burguês para a originalidade de gosto como Baudelaire tentou.)

 

[14av]

 

Paro às vezes, de repente, entre a vida que vai e a que vem, |estagno à margem do descaso|. E o assombro de tudo esboroa-se sobre mim.

 

Há outros momentos em que parece que o universo de repente representa mal e se trai noutros, em que parece subitamente ouvir-lhe outra vez, colher-lhe de relance outra naturalidade, {…}. Como um repente que um vento traz e num repente {…}, entrementes um bocado irrevelado de qualquer desolada e inesperada coisa…

______________________________________________________

O que há de belo é a alma da coisa o que não se vê nela. O mito nunca dá a alma das coisas. Quero por vez dá-la. Para isso defino o objecto como se vê. Mas isso só nos dá a alma da coisa pelo intermédio da obra.

Só a música e a poesia podem fazer isso. A poesia sim; descreve nitidamente, mas essa descrição nítida por sua natureza é aí descrição. Por sua natureza a poesia é espiritualizar.

Só a poesia pode, sem deformar, dar a alma de um objecto.   

 

[15r]

 

Todos os géneros de poetas místicos têm uma qualidade e um defeito certos – são sempre profundos (ainda que os mais humildes ocasionalmente apenas) e são sempre pouco artistas. Tem a arte que calha terem. Quando o que sentem atingir certo grau de lucidez e {…} atingem arte espontaneamente. Compõem sempre de dentro, nunca vendo-se, olhando-se de fora.

_______

Entendamo-nos bem. Eu chamo poeta místico ao poeta de ideias que dá as coisas a que chamamos reais um valor de meramente simbólicas e encontra entre elas |relações ocultas e íntimas| de ordem diversa daquelas que a ciência constata. (Eu não emprego “misticismo” aqui o sentido psicológico, no sentido em que Nordau empregou a palavra.)

____________________  

# a quem o motivo inspiracional de qualquer experiência é não o que ela lhe fez sentir (amor para os poetas de sentimento), não o que ela lhe fez lembrar (como para os poetas de imaginação), mas o que ela lhe faz pensar não pensar dentro do assunto (isso é sentir) intensificando-o, analisando-o, mas fora do assunto, tornando-o outro – o que ela significa para ele. Assim tomemos dois poemas de amor – os maiores, a meu ver, que se tem escrito: a Last Ride Toghether de Robert Browning, e a sua Elegia.  

 

[15v]

 

Os gregos – poetas de imaginação.

Renascentistas – poetas de sentimento. ?

Românticos – poetas de pensamento.

______________________________________________________

Pensando no amor, Musset nunca sai do amor; isto é, é um poeta de sentimento, não de pensamento. O amor como facto existente no mundo, como outras coisas coexistindo, e o Mistério envolvendo tudo – isso não o preocupa; o amor em si, as dores, as alegrias dele.

 

 

Amplia… até Deus

 

quanta “perda de sentimento” escreve isto – parece-lhe sim abandonado, já não-amor. Aqui o amor torna-se abstracção, perde o seu acento com que era sentido.

 

O poeta de sentimento mostra mas sente; o de imaginação encontra. O de pensamento paira, menos tangível, acima deles.

 

 

[1] existam/em\

[2] ser/(em)\

Notas de edição
Identificador
https://modernismo.pt/index.php/arquivo-almada-negreiros/details/33/4270

Classificação

Categoria
Literatura
Subcategoria

Dados Físicos

Descrição Material
Dimensões
Legendas

Dados de produção

Data
Notas à data
Datas relacionadas
Dedicatário
Destinatário
Idioma
Português

Dados de conservação

Local de conservação
Biblioteca Nacional de Portugal
Estado de conservação
Entidade detentora
Historial

Palavras chave

Locais
Palavras chave
Nomes relacionados

Documentação Associada

Bibliografia
Publicações
Exposições
Itens relacionados
Bloco de notas