Identificação
[BNP/E3, 88 – 15]
Toda a tendência da arte tem sido intelectualizar a sensação ou o sentimento. Propomo-nos inverter este processo, e sensacionar a inteligência. Em vez de partirmos da sensação, partimos da ideia; em vez de empregarmos a inteligência como mediador plástico, empregamos a sensação.
De aí o carácter absolutamente frio e intelectual da base da nossa arte. A emoção é em nós, não o fundo da nossa inspiração, mas o processo artístico dela.
(O simbolismo foi apenas uma obsessão musical. O futurismo não passa, em literatura, de um fenómeno tipográfico.)
A arte é uma mentira que sugere uma verdade.
A verdade, porém, é apenas o conceito de fazemos da objectividade.
A obra de arte é portanto uma mentira com carácter objectivo.
As características da objectividade são (1) a multiplicidade, por que, ao passo que me sinto Um, sinto o universo como Muitos; (2) a independência da minha personalidade, porque sinto que domino em mim, mas não nas coisas; (3) a fatalidade, porque, conquanto em minha consciência de mim me sinto livre, me sinto compelido como membro do Universo e ao Universo fora de mim, sinto-o escravo de leis imutáveis. Bem sei que estas minhas impressões são falsas – que eu nem sou uno, nem sou livre, nem domino em mim; como, porém, se trata de uma sensação, não procuramos a verdade além dela.