[BNP/E3, 14C – 86-87]
Milton
When, towards the end of ages, Christianity shall[1] have long gone to that vale of darkness where all creeds follow all men, the great power of Milton will stand for it before eternity. When the plays of Shakespeare shall, sunken in forgetfulness be but remembered in a true light of mind as the uncouth sublimities of a barbarous age; when not even the names of the latter poets - as Shelley, as Goethe, as Hugo - shall owe one moment to[2] survival, when the dust of our stired roads shall have settled over the dead bones of those who stired it[3], this man's songs shall yet sore for eternity before the eternity of the Gods {…}
His life was given to art, as a thing from him of small price. Every verse he wrote bears the full force of his dedicated will.
Dante and he stand before the ages as reminders of some forgotten thing. The rest is what remains, if that can be said to remain whose very |intellect| was wit in water, whose fame lived in the shadows, whose influence passed like a bug along despoiled waste, that only took up dead leaves from one place to put those dead leaves in another place.
[86v]
He was a builder where other men were sand-masons. They made sand-castles on the back of their emotions, more beautiful for the moment; if the end of building were that the thing built should not survive, and that it should be measured by the qualities peculiar to its faults, they were true poets, {…}
Goethe said once that the function of the artist was architectonic in the high degree. No man ever spoke a higher truth, nor lived less by the high truth which he spoke. That he stands condemned out of his own mouth cannot content us, who would rather have stood not condemned.
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Only what a man toils to build, does time toil to preserve. The "casual outpourings" of men who have in them all the elements of genius except the dignity of genius -.
The very lyrics of a Shelley are no more than occasional verse. All Byron is "vers de société."
[87r]
Hugo, though he lacked the sense of perfection, yet, when he forgot that he lacked it, strayed into some perfect poems. |Nothing can be more magnificent| than Booz Endormi; Á Villequier falls off that perfection, being too diffuse…
Another thing that is not often considered is that many of the sentiments which we to-day believe to be of all places and of all times, are really only of our time and place. This observation, which might[4] be easily admitted in reference to the poetry of the Symbolists and of the decadents, is perhaps less |generally| evident when it is brought to bear upon the art of the romantics[5]. Yet we have no more evidence that the general spirit of man, as manifested critically in relation to us by a distant posterity, will take to Mallarmé as to a poet who keeps, than that it will accept Shelley into its relative immortality. Nothing absolutely warrants the belief that The Sensitive Plant, human as it seems to us, is not merely human in our age of humanity. What has become of all but the names (?) of the followers of Gongora and[6] of Marini?
All art based upon sensibility rests on an unstable, or, at least, on an unstable basis.
[87v]
The art which, as the classic art, is based on the intellect stands on a surer basis. Thoughts pass, but not the general structure of thought. It may [be] said that, in a similar[7] manner and for a like reason, feelings pass, but not the fundamental structure of sentiment. Yet this is not so. It is the nature of feeling to have no generality in itself – none until thought shall enter into its composition.
Boileau is safer with the Gods than Shelley. Shelley may, probably is, the greater poet. But if we had to wager on the matter, it should be a risk to back Shelley. Shelley lives on his sensibility, and we cannot determine how far that sensibility is great and human, or how from it is merely ours.
Shakespeare survives in virtue of a creative power – the power of creating types and figures. His total incapacity for constructing ordered wholes, his absolute indiscipline of mind, his contempt for all the rules of thought and of art – these things cannot wholly smother the {…} vitality of his imagination. |But he is not of the Homerics.|
[BNP/E3, 14C - 86-87]
Milton
Quando, no fim dos tempos, o Cristianismo tiver ido para aquele vale de trevas onde todos os credos seguem todos os homens, o grande poder de Milton irá defendê-lo diante da eternidade. Quando as peças de Shakespeare, afundadas no esquecimento, forem lembradas a uma verdadeira luz da mente como as sublimidades rudes de uma época bárbara; quando nem mesmo os nomes dos poetas tardios - como Shelley, Goethe e Hugo - devam um momento à sobrevivência, quando a poeira de nossas agitadas estradas tiver pousado sobre os ossos mortos daqueles que as agitaram, as canções deste homem deverão ainda ferir pela eternidade diante da eternidade dos Deuses {…}
A sua vida foi entregue à arte, como uma coisa de pequeno valor para ele. Cada verso que ele escreveu carrega toda a força de sua vontade dedicada.
Dante e ele permanecem diante das eras como advertência de algo esquecido. O resto é o que resta, se é que se pode dizer que permanece aquele cujo próprio |intelecto| era sagacidade na água, cuja fama vivia nas sombras, cuja influência passava como um insecto pelos resíduos despojados, que só pegava nas folhas mortas de um lugar para colocar essas folhas mortas noutro lugar.
[86v]
Ele foi um construtor onde outros homens eram pedreiros. Eles fizeram castelos de areia por trás das suas emoções, mais belas para o momento; se o fim da construção fosse que a coisa construída não sobrevivesse, e que fosse medida pelas qualidades peculiares às suas falhas, eles eram verdadeiros poetas, {…}
Goethe disse uma vez que a função do artista era arquitectónica em alto grau. Nenhum homem falou uma verdade mais elevada, nem viveu menos pela alta verdade que ele falou. Que ele seja condenado por sua própria boca não pode contentar-nos a nós, que preferiríamos não ter sido condenados.
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Apenas aquilo que um homem se esforça para construir, o tempo se esforça para preservar. Os “jorros ocasionais” de homens que têm em si todos os elementos do génio, excepto a dignidade do génio -.
As próprias líricas de Shelley não passam de versos ocasionais. Tudo em Byron é “vers de société”.
[87r]
Hugo, embora lhe faltasse o senso de perfeição, porém, quando se esquecia que lhe faltava, dispersava-se em alguns poemas perfeitos. |Nada pode ser mais magnífico| do que Booz Endormi; Á Villequier não tem essa perfeição, sendo muito difuso…
Outra coisa que nem sempre é considerada é que muitos dos sentimentos que hoje acreditamos serem de todos os lugares e de todos os tempos, são realmente apenas de nosso tempo e lugar. Esta observação, que pode ser facilmente admitida em referência à poesia dos Simbolistas e dos decadentes, é talvez |geralmente| menos evidente quando é aplicada à arte dos românticos. No entanto, não temos mais evidências de que o espírito geral do homem, tal como se manifestou criticamente em relação a nós por uma posteridade distante, tornará Mallarmé como um poeta que irá permanecer, do que aceitará Shelley em sua relativa imortalidade. Nada garante absolutamente a crença de que A Planta Sensível, humana como nos parece, não é meramente humana em nossa era de humanidade. O que é feito de todos os seguidores de Gôngora e de Marini, salvo os seus nomes (?)?
Toda arte baseada na sensibilidade repousa sobre algo instável ou, pelo menos, numa base instável.
[87v]
A arte que, como a clássica, se baseia no intelecto assenta numa base mais segura. Os pensamentos passam, mas não a estrutura geral do pensamento. Pode dizer-se que, de maneira semelhante e por uma razão semelhante, os sentimentos passam, mas não a estrutura fundamental do sentimento. No entanto, não é assim. É da natureza do sentimento não ter generalidade em si mesmo - nenhuma até que o pensamento entre em sua composição.
Boileau está mais a salvo com os deuses do que Shelley. Shelley pode ser, e provavelmente é, o maior poeta. Mas se tivéssemos que apostar no assunto, seria um risco apoiar Shelley. Shelley vive da sua sensibilidade, e não podemos determinar até que ponto essa sensibilidade é grande e humana, ou como é que a partir dela é apenas nossa.
Shakespeare sobrevive em virtude de um poder criativo - o poder de criar tipos e figuras. A sua total incapacidade de construir todos ordenados, a sua absoluta indisciplina de espírito, o seu desprezo por todas as regras do pensamento e da arte - essas coisas não podem abafar completamente a {…} vitalidade da sua imaginação. |Mas ele não é dos homéricos. |
[1] shall /will\
[2] shall owe /deserve\ one moment to /of\
[3] it /them\
[4] might /may\
[5] romantics/ists\
[6] and /or\
[7] similar /like\