(1881-1967)

Foi, apesar da sua longevidade, um artista mal amado no contexto da arte portuguesa. Tal como o foram Eloy, Alvarez ou Júlio. À falta de ser estudado num contexto de recepção favorável que beneficiasse a valorização do que, em cada um, foi sinal de uma diferença fundamental.

Numa visão que permaneceu longamente afrancesada, a apreciação da sua obra tinha que estar necessariamente comprometida por essa incompreensão de que falece a nossa cultura antes que o reconhecimento externo a venha louvar, ou ensinar ao indígena que o valor lá está como coisa intrínseca que não depende da parecença com o modelo externo. E, no entanto, Viana foi apreciado no seu tempo por quem talvez mais importasse: Robert e Sonia Delaunay (com quem Viana habitou em Vila do Conde em 1915-1916) ou Amadeo, que todos esses, génios maiores, o consideraram. E permanecem, sobre a sua obra, os dois ou três ensaios que lhe dedicaram Fernando Pernes e Raquel Henriques da Silva, esta última no contexto da exposição que organizou para a Europália.

Viana ficou pois, para além desse raro momento modernista da sua obra, em que fez parte do núcleo vertiginoso em que Almada e Amadeo se moviam em 1915-1917, confinado a um reconhecimento mais burguês, quer pelo lado do mercado, onde a obra foi reificada, mesmo que não necessariamente pelas melhores razões, quer pelo das instituições, como garante de uma certa feição mais conservadora da obra, reconhecida que foi a outra, de lado modernista – de que pinturas como K4 O Quadrado Azul ou La Petite, ambas de 1916, são exemplos – como momento de juvenil inspiração. Sem se entender o que nele há ainda de uma inspiração simbolista, atestada em obras como Esperando (1913), ou de fauve, como nas naturezas mortas dos anos 15, capazes como Amadeo de incorporar a cor do sol generoso de Lisboa, ou de um surpreendente orfismo que ninguém mais ousou por cá além dele, como se vê no prodigioso A Revolta das Bonecas também de 1916, momento extraordinário em que a arte portuguesa dialogou em pé de igualdade com o Modernismo internacional. Depois, O Homem das Louças, de 1919, constitui outra culminância, já depois da fase heróica, de toda a sua obra.

E, no entanto, esses nus que pintou – e que constituem um dos momentos mais afirmativos de uma verdadeira assunção do corpo na arte portuguesa, pudibunda nos seus modos – está ainda em grande medida por entender como excepção rara da presença de uma sensualidade da pintura que, noutros lugares e contextos se louvou em outras gentes, como em Brancusi ou Modigliani.

No seu silêncio, porém, essa obra longa e longamente perseguida em valores lumínicos e de sólida pintura, tão carnal como os seus nus, ainda aguarda paciente a retrospectiva fundamental que a retire do seu papel empobrecido de mero fruto de um mercado cujo apetite, também ele, de pouco se contenta.

 

Bibl.: Eduardo Viana 1881-1967, Porto, Fundação de Serralves, 1992.  

 

 

Bernardo Pinto de Almeida